Hoje deparei com uma página
em branco esperando que uma união de caracteres lhe desse algum significado. Fez tremer. Não gosto de páginas em branco.
Elas me dão medo. Impotência do que não sei.
Não saber é uma
incongruência. Sempre não sabemos de algo. A velha máxima filosófica do “só sei
que nada sei” me parece injusta. Lembra-me o fato de que não lerei todos os
livros que gostaria, não conhecerei todos os lugares que sonhei, nem encenarei todas as peças que me fascinam.
Tanta ausência do que não
sei, sem saber. Ao invés de página em branco quero rascunho, feito a lápis.
Rizoma de experiências e lástimas que precisam vir a ser, virar ser. Tomar o
todo pela coisa e todos os vice-versa possíveis.
A página em branco é um
desafio. O palco vazio, sem luz, som, cenário e sem atores é página em branco.
Sem alma. Que grita e implora sua urgência de ser preenchida. É como ser
criador de coisa nenhuma, de vazios emocionais. É não ter nada pra dizer e
desembestar a falar do clima, do caos da cidade e do vício da corrupção.
Temendo ser o nada, escrevo.
Comprimo a ponta dos dedos nas teclas unindo pensamento e ação. Unindo palavra
e gesto e corpo e música vou descobrindo o espaço que ocupo. Sem mais ordem
cartesiana, do fim ao começo ao meio, brincando de ser. Fazendo sou poesia
concreta dispersa no vento.
O criador precisa viver e
estar presente. Ser atuante em suas escolhas, dentro e fora dos meios
escolhidos. A arte tem que pulsar em todos os sentidos e direções, formando um
fluxo espiral que envolve aspectos físicos, psicológicos, emocionais. Criar
somente no papel, na tela, no palco, também é estar página em branco. Criar é
ser pensamento, desejo, ação e reação, reflexo de sua consciência e crítica.
Monólogo de Molly Bloom - O homem do princípio ao fim