quinta-feira, 10 de novembro de 2011

O Palhaço



Gato bebe leite, eu sou palhaço! A simplicidade do pensamento de Valdemar, personagem de Paulo José no filme O Palhaço, de Selton Mello, resume um pouco o sentimento do expectador, na sala escura do cinema, entrando nesse universo circense.

Fui assistir ao filme em sua estreia, alguns dias atrás. Estava bem ansiosa, mas já me surpreendi antes do filme começar: a sala estava quase vazia. Achei que não fosse conseguir ingressos, tanta era minha expectativa. Fiquei até com medo de não gostar, expectativa demais quase sempre termina com frustrações. Qual o quê? Eu estava muito enganada. Não só gostei, como há muito tempo não via algo que me tocasse tanto.

Uma narrativa simples e direta, com personagens bem delineados e totalmente possíveis. Interpretação sincera de um elenco entrosado e afinado. Fica visível a unidade de pensamento e empenho, de veteranos e também de iniciantes.

Essa “família”, feita por artistas que seguem com o Circo Esperança – nome cheio de significado e significância – na dificuldade de sustentar-se e o desejo de fazer sorrir a plateia.

Aquela velha história do palhaço triste, que usa uma máscara para fazer sorrir, aqui ganha linhas e contornos na delicadeza que o diretor/ator/ produtor imprime nos detalhes. O que vi foi poesia. Cores reais de um trabalho que eu chamo de sacerdotal.

Valdemar (Paulo José) e Benjamin (Selton Mello) formam a dupla de palhaços Puro Sangue e Pangaré, que expõem o artista em seu estado mais primitivo, quando entrega sua vida em função da arte, simplesmente por que não sabem e não querem fazer outra coisa de sua vida.

Sinto o filme como uma homenagem a todos os artistas, de circo ou não, que fazem da sua expressão uma forma de vida, dos sonhos matéria prima e do aplauso riqueza infinita. Descobri que um ventilador pode conter tanta história... Recordo os antigos filmes dos Trapalhões. E de lugares escondidos na infância.

Quando era bem pequena, não perdíamos um circo que chegasse na cidade, fosse ele o mais simples ou o mais luxuoso. E eu escondia de todos a fantasia de fugir com o a trupe. Quando vi a pequena Larissa Manoela e seus olhinhos brilhantes no picadeiro, não consegui guardar no peito aquela lembrança. “Um dia estarei no picadeiro”, dizia só pra mim o que só revelo agora.

Esse sonho consegui realizar, no Circo Escola Águia de Haia, na Zona Leste de São Paulo, onde por cerca de um ano ministrei aulas de teatro para as crianças. Naquele picadeiro pude sentir a magia, que antes eu só conhecia do outro lado. Infelizmente foi um sonho curto, mas inesquecível.

Atualmente experimento, nas aulas da Cida Almeida, da Escola de Teatro SP, uma nova possibilidade. A possibilidade de me encontrar novamente com aquela menina, que suspirava e sorria ouvindo sempre: “Hoje tem marmelada? Tem sim Senhor! Hoje tem Goiabada? Tem sim Senhor. E o Palhaço, o que é?” E eu responderia como tio Caíto, meu palhaço preferido na vida: E o Palhaço o que é??? -“Um cara muito bacana”.


*Foto de divulgação